2016-12-20
Apontado pelos especialistas como exemplo a ser seguido quando o assunto é preparação da sucessão, o Grupo Boticário primeiro preparou a passagem de bastão na franqueadora para, depois, estruturar o primeiro programa de sucessão de franqueados do setor. “Foi um processo longo, de grande aprendizado, com avaliações constantes, porque não existe cadeira reservada para a família na empresa”, afirma Artur Grynbaum, presidente do Grupo Boticário. “Todos nós passamos por avaliação de competências no mapa da sucessão”. Ele assumiu a presidência executiva em 2008 e por algum tempo, lembra, colocava em prática a técnica do chapéu quando ia conversar com o fundador e cunhado Miguel Krigsner. “Usava a técnica para mostrar formalmente que naquele momento quem fazia a pergunta era o presidente executivo e não o cunhado, ou vice-versa”, diz Grynbaum. “É essencial não misturar os papéis e preservar as relações, afinal o almoço de domingo tem de ser festivo”, afirma.
Com a lição praticada na franqueadora em 2010 o Boticário lançou o programa O Futuro em Nossas Mãos, em que filhos de operadores das franquias da rede são preparados para assumir o negócio da família. O programa tem adesão voluntária e inclui encontros presenciais e módulos de ensino à distância. A primeira turma formou-se em 2012. “Já estamos na sétima e os resultados têm sido cada vez mais positivos”, diz Grynbaum. “Ajudamos nossos franqueados a alinhavar esse ritual de passagem, a ter uma visão clara de quem na família tem perfil para ser operador e quem será exclusivamente herdeiro”. Outro cuidado tomado pela rede é envolver no processo de preparação o sucessor e o sucedido, despertando um amadurecimento nesse processo, pois abrir espaço para a chegada do outro é importante.
Embora bastante alinhavado entre os franqueados, o presidente de O Boticário reconhece que a tarefa não é simples porque envolve emoção, sentimento e, muitas vezes, a história de uma vida. “Há casos em que o filho não quer assumir o negócio, em outros o franqueado não tem quem o suceda e prefere abrir mão do negócio a colocar um executivo de mercado ou, ainda, repassar a franquia”, diz Grynbaum. Tudo isso, segundo ele, precisa ser acompanhado de perto, porque franquia não é herança, a rede depende do desempenho de cada um, precisa ser oxigenada. “A nova geração tem de comungar os valores da marca e ter o mesmo brilho nos olhos da primeira geração, o que nem sempre é possível”, afirma.
Foi justamente por não ter vivenciado uma passagem de bastão tranquila e preparada que Marlin Kohlrausch, presidente da Bibi Calçados, empresa com 67 anos de mercado e há dez no franchising, decidiu implementar um programa de preparação de sucessores. Com a ajuda da Fundação Dom Cabral, quatro candidatos estão sendo preparados e um deles assumirá a presidência até o final de 2018. “Há 25 anos, quando assumi a empresa fundada por meu pai, a situação era crítica, ninguém queria”, lembra o empresário. “Ou erguia ou fechava. Eu não tinha sido preparado para assumir as rédeas”. O processo todo levará cerca de oito anos, período no qual os quatro estão sendo criteriosamente avaliados, tendo as competências analisadas. Independentemente de quem assumir a cadeira, há um acordo entre eles de pleno apoio, diz Kohlrausch.
Embora a rede de franquias seja nova, com apenas uma década e 95 unidades, o presidente adianta que já há uma preocupação em criar um programa específico para os franqueados, com ajuda de coaching e muito treinamento de gestão. “É preciso preparar o cenário para quando as primeiras mudanças começarem a ocorrer”, afirma.
O consultor Wagner Luiz Teixeira, sócio da Hoft Transição de Gerações, alerta sobre a importância de a franqueadora ajudar na estruturação da sucessão entre seus franqueados. “Se antes a maioria tinha apenas um ou duas lojas, hoje a presença do franqueado que compõe sua pequena rede é grande”, diz. “Se a passagem do bastão não for bem-feita nesses casos, corre-se o risco de comprometer uma parte considerável do negócio.”
Fonte: Valor Econômico