2016-05-10
Desde o ano passado, mais de 1,6 milhão de pessoas perderam o convênio médico e o orçamento do Sistema Único da Saúde (SUS) teve uma redução de cerca de R$ 12 bilhões. Nesse cenário, o mercado de clínicas médicas populares deve mais que dobrar nos próximos dois anos, com aportes de investidores de diferentes perfis. Juntos eles estão investindo cerca de R$ 500 milhões em cinco redes: Dr. Consulta, Meu Doutor, Clínica Fares, Dr. Agora e Clínica SIM-Serviços Integrados em Medicina.
Além da expansão orgânica, as clínicas médicas populares – cujo preço da consulta varia de R$ 89 a R$ 120 – estão diversificando o negócio. Boa parte desses consultórios atende principalmente casos simples, mas em alguns deles já é possível realizar pequenos procedimentos cirúrgicos e exames de imagem como raio-x e ultrassom.
A concorrência neste mercado promete ser acirrada. Várias dessas redes têm à frente executivos tarimbados, acostumados a planilhas e métodos de gestão, e médicos experientes na sociedade. A Dr. Consulta vai nessa toada. Foi criada pelo administrador de empresas Thomaz Srougi, com passagem pela Ambev e MBA por Harvard. Filho do médico Miguel Srougi, renomado urologista do Hospital Sírio Libanês, Thomaz tem como sócios médicos formados pela USP e por Harvard.
Fundada em 2011, em Heliópolis, uma das maiores favelas de São Paulo, a Dr. Consulta tem atualmente 12 unidades e faz 50 mil atendimentos por mês. Deve chegar ao fim deste ano com 30 clínicas. A rede já recebeu investimento de US$ 42 milhões de fundos estrangeiros e dos sócios fundadores, que detêm o controle. “A empresa é baseada em três pilares: gestão, dados clínicos e bons profissionais. Quando resolvemos alçar um empreendimento, pensamos em replicar o modelo de gestão que aprendemos na Ambev”, diz Thomaz.
Ele afirma que investe muito em tecnologia tanto para o operacional quanto para análise de dados médicos dos pacientes. Essas informações também ajudam o médico a traçar o tratamento mais adequado.
Outra rede em expansão é a Clínica SIM – Serviços Integrados em Medicina, que atua no Norte e Nordeste, regiões onde há menos pessoas com planos de saúde. Denis Cruz, fundador e presidente da SIM, espera elevar o faturamento em 78% este ano e passar de seis para dez unidades.
“Percebemos um aumento na procura por parte das pessoas que tinham convênio médico e que não estão dispostas a ‘navegar’ no SUS. As clínicas populares estão se tornando uma terceira opção ao SUS e ao plano de saúde com uma velocidade altíssima”, afirma.
A empresa está levantando uma nova rodada de recursos com fundos de investimento para financiar a ampliação dos negócios e atender a demanda crescente. O primeiro aporte foi feito por um grupo seleto de investidores como Carlos Alberto Degas Filgueiras (presidente do grupo Devry, de educação), Rodrigo Galindo (presidente do grupo Kroton), Ari de Sá Neto (fundador do sistema de ensino SAS) e Rafaela Villela (sócia do fundo de investimento Gera Venture Capital, do empresário Jorge Paulo Lemann).
“O Rodrigo e o Degas me ajudam muito na gestão porque o modelo de negócio deles também é baseado em escala e qualidade. Nesse sentido, por exemplo, decidimos expandir com unidades próprias para ter mais controle do negócio e não por meio de franquia”, diz Cruz, que é formado pela Universidade de Stanford, na Califórnia, onde também estudou o presidente da Devry. A universidade americana foi o elo entre Cruz e Degas, o primeiro a investir na rede de clínicas populares e que, por sua vez, convidou outros empresários da área de educação para a sociedade.
A Meu Doutor abriu, no sábado, sua primeira unidade de olho no envelhecimento da população e em pacientes com doenças crônicas. A empresa já começa com investimento de R$ 100 milhões e a meta é ter 15 consultórios até o fim do próximo ano. Segundo o Valor apurou, o investidor é a gestora australiana de fundos Simon Partners que passou a deter 52% da Meu Doutor. A outra fatia está distribuída entre o fundador, o cardiologista Maurício Serpa, e o pediatra Thiago Caetano, ambos médicos do Hospital São Luiz Rede D’Or.
“Nosso foco é o trabalho de prevenção. Montamos pacotes para pacientes de doenças crônicas. São 12 consultas por ano por R$ 79 ao mês. A consulta de um atendimento normal varia de R$ 89 a R$ 99”, diz Serpa. A primeira unidade fica no Grajaú, bairro pobre em São Paulo. “O hospital público Grajaú atende 45% acima de sua capacidade”, acrescenta ele, que começou a desenhar o projeto há três anos e foi em busca de investidores.
Com investimento e experiência de Rick Krieger, um dos fundadores da Minute Clinic, rede de consultórios instalados dentro das farmácias americanas CVS, a Dr. Agora tem como estratégia ter unidades em áreas de grande circulação como estações de metrô e supermercados e foco em atendimentos simples. “O modelo brasileiro de saúde é ineficiente. Cerca de 70% dos atendimentos realizados em pronto-socorro poderiam ser tratados em consultório”, afirma Guilherme Berardo, fundador e presidente da Dr.
Agora, cuja meta é triplicar o número de clínicas até 2017. Hoje, são cinco unidades em funcionamento em São Paulo.
No mercado há quase 30 anos, a Clínica Fares também tem um plano ambicioso de expansão. Espera passar das atuais duas unidades para 14 até 2019. O projeto vai demandar investimentos de cerca de R$ 130 milhões. Os recursos serão aplicados pelo criador da rede, o médico Adiel Fares, um dos fundadores da varejista de móveis Marabraz. O modelo de negócio da Clínica Fares é um pouco diferente dos seus concorrentes, uma vez que atende também planos de saúde e realiza procedimentos como pequenas cirurgias, como biópsia, por exemplo. “Para cirurgias de alta complexidade, temos parcerias com hospitais. Compramos um período do dia do centro cirúrgico dos hospitais e com isso conseguimos melhores preços para nossos clientes”, diz Fares.
Fonte: Valor