Grupo Bittencourt
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Companhias incentivam rodízio entre gestores

Grandes empresas estão incentivando executivos mais seniores a mudar de função, área ou país como forma de desenvolvimento profissional. O movimento, diferente do sistema temporário de “job rotation”, muitas vezes ganha um caráter definitivo, sem retorno ao cargo original, e tem ajudado a reter talentos e cortar custos com recrutamentos externos.
Diretores de recursos humanos de corporações como EDP Brasil, Alelo e Elsevier destacam que as ações também provocam aumento de produtividade e abrem novas trilhas de carreira para os profissionais. Em algumas companhias, a taxa de adesão dos quadros às iniciativas de mobilidade quase duplicou.
A EDP Brasil, holding do setor de energia elétrica com três mil funcionários, criou no ano passado um programa de alcance global para promover rotatividade entre áreas, empresas e países onde o grupo está presente. “A iniciativa ajuda na interação entre colaboradores com experiências distintas, reduz custos com recrutamento externo, aumenta a satisfação e a produtividade”, explica a diretora de recursos humanos Fernanda Pires.
O programa funciona de forma permanente e temporária. No primeiro modelo, o funcionário se muda definitivamente do setor de origem para desenvolver novas habilidades. No segundo, pode trabalhar em uma nova área por um período que vai de três a seis meses, desenvolvendo um projeto específico. O prazo pode ser estendido a pedido do profissional ou do departamento que o acolheu.
Por meio da ação, o índice de mobilidade interna na companhia quase duplicou em um ano. Subiu de 24%, em 2014, para 41% em 2015. Houve 16 promoções internas em cargos de gestão em 12 meses e dois líderes ganharam experiências internacionais nos últimos dois anos. Como a EDP é de origem portuguesa, a maioria dos funcionários segue para unidades em Portugal.
“Ao saber do meu interesse por uma carreira internacional, a área de RH buscou vagas para que eu pudesse participar de processos de seleção”, diz Mariana Meyer, 37 anos, gerente de marketing de produto da editora Elsevier, que também aposta no trânsito corporativo. Na empresa há sete anos, ela já foi gerente de desenvolvimento de contas, de vendas e de canais para e-books. Desde 2013, participa de um projeto que valoriza talentos da casa e costura projeções de carreira.
“Agora, vou para a Elsevier Espanha trabalhar como gerente de soluções de conteúdo em língua espanhola”, diz a executiva, que sempre morou no Rio de Janeiro. O contrato no exterior não tem tempo determinado. “É uma oportunidade de aprender com colegas estrangeiros e dar um peso maior ao currículo.”
Os trâmites de visto e documentação serão cobertos pela companhia, além de custos de mudança e residência nos primeiros meses. A negociação também envolve orientações sobre direitos trabalhistas, benefícios e impostos locais. “Se eu não fosse fluente em inglês e espanhol, a oportunidade não teria acontecido”, diz Mariana. “Quem tem vontade de fazer uma carreira fora do país deve conversar com as chefias e o setor de RH. Achei que seria difícil, mas percebi que a experiência no Brasil é valorizada globalmente.”
Segundo Luciana Pompilio, diretora de RH para a América Latina da Elsevier, não é somente o tempo de casa que pesa na escolha de candidatos ao programa de mobilidade, montado há cinco anos. Os critérios incluem ainda avaliações de desempenho e o interesse em áreas sintonizadas com o futuro da empresa.
“Como não temos um grande número de funcionários no Brasil [são 150], identificamos também uma oportunidade para desenvolver carreiras”, afirma a diretora. O objetivo é ter de 7% a 10% do quadro elegível ao programa. Pelo menos 20 executivos foram beneficiados em 2015 e 2016. Em cinco anos, três foram transferidos para o exterior, em posições nos Estados Unidos e na Espanha.
Luciana diz que funcionários e chefias têm encontros formais para discutir o tema na companhia. As conversas são pautadas com base nas realizações do funcionário, nas entregas que ainda precisará fazer e nas trilhas de carreira pretendidas. Tudo é registrado em um sistema, disponível para o RH e gestores seniores e usado nos processos de recrutamento. “As vagas em outros países são divulgadas na intranet e podem ser acessadas por todo o quadro de funcionários.”
Em algumas organizações, ações de mobilidade mais maduras já revisam a relação entre líderes e funcionários diante de futuras promoções. Em 2017, na Alelo, do setor de benefícios e gestão de despesas corporativas, não será mais necessária a aprovação formal da chefia para a participação de funcionários em recrutamentos internos.
“As conversas sobre carreira acontecem com frequência e o gestor já está ciente das ambições do seu time”, justifica Soraya Bahde, diretora de gente e gestão. “Já houve casos em que o próprio chefe estimulou a vontade do empregado, pois sabia que a vaga era alinhada a um interesse de carreira.”
A Alelo tem 600 funcionários e relançou um programa de recrutamento interno no início de 2014. Em 2015, aderiu a uma política que incentiva a movimentação de pessoas no conglomerado Elopar, que engloba a própria Alelo, além da Livelo, Stelo, Elo, IBI e Banco CBSS. As mudanças podem ser baseadas em promoções na mesma área ou transferências com e sem promoção. São definitivas e não há possibilidade de retorno à posição anterior.
Entre 2014 e 2016, foram aprovados 72 funcionários no programa, entre coordenadores, especialistas e consultores. A maioria veio de setores como o comercial, com 31% do total; operações e tecnologia (21%), finanças (17%) e marketing (12%). “Para participar, o executivo deve ter no mínimo um ano de empresa e oito meses no cargo”, diz Soraya. “Com isso, vamos reter talentos, ganhar mais assertividade nas contratações e reforçar a meritocracia.”
Foi o que aconteceu com Heribert Bastos, de 43 anos, gerente de sistemas de dados da Alelo e há mais de um ano na companhia. Em 2016, participou da iniciativa de mobilidade entre as organizações do grupo Elopar. “Troquei de empresa e de cargo”, diz o executivo, que ocupava a função de especialista da Livelo.
“Quando a Alelo divulgou a oportunidade, tive certeza que poderia contribuir com a minha experiência. Participei do processo com candidatos externos, alguns até indicados por mim, e acabei aprovado”, diz. “Vi que a mobilidade era real e possível.”
Fonte: Valor